No mundo do ginásio e do treino existem muitos critérios que se aceitaram como verdades absolutas e que, no entanto, não o são. Alguns parecem rigorosos e têm uma razão lógica à partida, mas não correspondem à realidade. Vamos revelar aqui o que está certo em algumas dessas crenças, quais encerram princípios errados e o que podemos fazer para que os nossos treinos sejam mais eficazes e produtivos.
1. Pés apoiados
Tradicionalmente entendeu-se que fazer exercícios de musculação com as costas e, especialmente, a zona lombar apoiada é mais seguro e saudável. A realidade é que a nossa coluna está desenhada para nos estabilizar e suportar cargas. Esta estrutura deve receber parte da carga e estímulo de treino para obter
benefícios e adaptações ao mesmo nível que os músculos que pretendemos trabalhar. Desta forma, evitaremos desequilíbrios e conseguiremos uma mecânica mais eficiente quando desejarmos mover cargas elevadas ou realizar movimentos de potência.
O supino plano é um exercício BEM ilustrativo deste critério. Aconselha-se sempre fazer o levantamento da barra com os pés elevados, inclusivamente ainda hoje se fabricam bancos com apoio para os pés. A priori pensamos que se a zona lombar estiver apoiada estará mais estável e segura, mas a longo prazo, quando progredimos e somos capazes de mover cargas superiores, chega um momento em que apoiar os pés afastados no solo nos traz uma série de vantagens; a primeira é que temos maior estabilidade, o controlo sobre a inclinação da barra para os lados é maior do que quando os pés estão elevados, a segunda, e mais importante, é que podemos elevar ligeiramente a zona lombar e inclusivamente a bacia. Esta posição é mecanicamente mais favorável para elevar cargas altas uma vez que conseguimos recrutar o peitoral num grau de ataque muito mais eficaz ao implicar a sua porção inferior graças à elevação do tronco.
Se observarem os grandes levantadores de peso, no supino plano elevam a sua zona lombar de forma muito evidente, melhoram a estabilidade e eficiência apoiando os pés e inclusivamente fletindo os joelhos e empurrando o solo com as pontas dos pés. Ainda que a zona lombar se arqueie, o certo é que os corpos vertebrais não têm carga sobre eles.
Este princípio pode ser aplicado a outros exercícios como o press de ombros: mais do que sentado num banco com os pés elevados e as costas apoiadas, o conveniente é apoiar os pés no solo e eliminar o apoio de costas. Aí estaremos preparados para fazer um press em pé.
Se é principiante, convém começar por estabilizar a coluna, mas à medida que os seus níveis de força e controlo postural melhorarem, pode ir integrando exercícios em que a sua coluna seja obrigada a estabilizar-se com o seu próprio controlo e músculos estabilizadores e não através de meios externos como o encosto de um banco ou uma máquina.
2. Não treinar em demasia os grupos musculares pequenos
Faz séries para todos os grupos musculares? Talvez não seja necessário. Os grupos musculares pequenos são sinergistas e secundários nas ações dos grandes, ou seja, já atuam e são estimulados quando realizamos um movimento geral com uma carga considerável, não sendo imprescindível um trabalho extra, analítico, e muito menos fazer séries intermináveis que congestionem os pequenos músculos pensando num benefício extra de hipertrofia, pelo contrário estaríamos a limitar o seu crescimento muscular.
Se soubermos um pouco sobre como se gera a hipertrofia muscular ou a melhoria da força, dar-nos-emos conta que o importante é sermos capazes de gerar um estímulo com um mínimo de intensidade que seja capaz de gerar adaptações no nosso organismo, neste caso a nível hormonal, metabólico e a longo prazo de aumento de tamanho muscular.
Assim sendo, salvo casos em que o objetivo seja mesmo ver alterações a curto prazo nos grupos musculares pequenos, centre os seus objetivos de treino em trabalhar de forma intensa os grandes grupos musculares e não dilatar os treinos acrescentando em demasia exercícios analíticos de grupos musculares pequenos.
3. Treinar descalço
Recentemente surgiu uma tendência de voltar aos treinos naturais e recuperar a consciência do nosso corpo. Um dos novos critérios é que os pés recebam um estímulo o mais natural possível, o que implica estar descalço ou usar um calçado minimalista.
Tal como as suas mãos ficam limitadas quando usa luvas, com os pés passa-se o mesmo. Essa limitação, exercida primeiro pelas meias e depois pela pressão do calçado, altera a configuração mecânica natural do pé. A tendência natural é que o metatarso e as falanges se expandam à medida que a pressão do apoio
aumenta, no entanto a maioria das formas dos calçados mantêm uma pressão que impede esta disposição. Por outro lado, as solas com sistemas de amortecimento desvirtuam o estímulo propriocetivo nos apoios, as articulações perdem capacidade de resposta e, no final, o impacto que em teoria minimiza a sola acaba por limitar os processos propriocetivos do pé.
Mecanicamente devemos saber que tudo o que afeta a nossa passada se transmite para a articulação que se segue, neste caso o joelho, depois a anca e por fim a coluna.
Isto não quer dizer que devemos correr, saltar ou jogar ténis descalços, mas que podemos realizar alguns exercícios descalços ou com um calçado minimalista. Uma boa opção é que, se tiver possibilidade, acabe os seus treinos de corrida com uma caminhada descalço, que alongue libertando o pé ou que faça exercícios de estabilidade, equilíbrio e até alguns exercícios de força (ex: agachamento, lunge, ou peso morto) descalço para apreciar as sensações a partir da planta do pé.
4. Dieta + cardio não funciona
De certeza que conhece muita gente que começou a fazer dieta e exercício cardiovascular ao mesmo tempo. Seguramente muitos terão fracassado. Em teoria está certo: comemos menos + queimamos mais = perdemos peso. No entanto, a realidade é relativamente diferente e não é assim tão simples.
Quando pessoas sedentárias combinam estas duas opções, o seu organismo, que ainda não está adaptado a estas mudanças interpreta que alguma coisa não está bem e a sua resposta é poupar energia através de uma descida do metabolismo, que em vez de queimador se torna poupador, pelo que teremos o efeito contrário ao desejado.
Por outro lado, ao começar a realizar exercício os músculos tornam-se mais ativos e necessitam de um aporte maior de energia. Se fizermos dieta estamos a limitar a capacidade energética dos músculos, e o resultado é que ao fim de poucos treinos podemos debater-nos com uma fadiga acumulada e pouca energia.
Pode-se perder peso de forma rápida mas esta poderá ser uma má notícia, sinal de que os nossos músculos estão a ficar vazios e o organismo nestas primeiras etapas ainda não tem capacidade de resposta, por isso só vamos conseguir uma perda de energia, um metabolismo mais lento, a desistência e a recuperação do peso inicial.
Quando começar a fazer exercício, não siga uma alimentação baixa em calorias ou algum tipo de dieta milagrosa. O melhor é que simplesmente coma de forma saudável e equilibrada, mas coma bem, faça entre 5 e 6 refeições por dia, coma hidratos, tome um bom pequeno-almoço, faça um jantar mais leve e deixe passar umas semanas. O seu corpo vai ficar encantado com esta nova situação e pouco a pouco vais sentir-te com mais energia.
5. Não alongar em demaisa no final
A verdade é que é bom soltar os músculos e mobilizá-los um pouco incluindo alguns alongamentos suaves e passivos com o objetivo de facilitar a recuperação muscular depois de um treino. O problema é quando queremos melhorar a flexibilidade no final dos alongamentos e procuramos alongamentos mais intensos com amplitudes articulares amplas e durante muito tempo.
Depois dos treinos não deve fazer alongamentos intensos, pois o músculo já está cansado e com múltiplos danos provocados pelas contrações e impactos. Se alongarmos em excesso os tecidos pode ser mais prejudicial que benéfico, não é o momento adequado para chegar ao limite do alongamento, o tecido muscular e sobretudo conjuntivo não se encontra no momento mais favorável.
Em primeiro lugar, faça um retorno à calma ativo, basta caminhar um pouco ou soltar um pouco os músculos com um ritmo muito suave. Parar bruscamente e começar a alongar não é uma boa opção. Despois deste retorno à calma ativo, devem realizar-se alongamentos suaves e passivos, ou seja, nada de grandes amplitudes articulares com alongamento máximo dos músculos. Nesta situação é muito melhor fazer um alongamento submáximo progressivo e manter durante uns segundos, desta forma facilitaremos o fluxo sanguíneo e limparemos o músculo de resíduos, ficando assim muito mais solto e limpo. A duração também não deve ser muito prolongada, basta entre 5 e 15 minutos.
6. Para principiantes, primeiro um pouco de força
“Para começar no ginásio deve ser feito trabalho cardiovascular suave.” Quantas vezes já ouviu esta frase? Parece ser a melhor forma de iniciação por se tratar de intensidades muito baixas. Mas o que esquecemos é que para haver algum benefício devemos fazer esta atividade durante muito tempo e durante vários dias, e o que acontece é que um gesto à partida tão suave como caminhar pode ser impossível de prolongar no tempo para pessoas com má condição física ou excesso de peso.
Devemos ter em mente que com cada pedalada, cada passo, realiza-se uma contração muscular, talvez ligeira, mas que repetida uma e outra vez acaba por representar uma fadiga local a nível muscular. É fácil observar como pessoas que se estão a iniciar cansam-se não por terem uma pulsação elevada mas por algo tão simples como a fadiga muscular. Cansam o quadricípes ao pedalar, os braços ao remar, os gémeos na elíptica e por muito bem que estejam as suas pulsações a verdade é que os músculos não aguentam mais.
A solução é condicionar os músculos para garantir posteriormente uma capacidade mínima que garanta um certo volume de treino nas atividades cardiovasculares. Uns quadricípes bem tonificados vão suportar melhor a pedalada.
Conselho: Se acabou de se inscrever no ginásio e está a pensar passar as duas primeiras semanas a fazer bicicleta, podes ir mudando de ideias. É melhor começares por fazer um circuito de força pelo menos duas vezes por semana, combinando com o trabalho cardiovascular. A primeira coisa a fazer é começar a pôr os músculos em forma, depois o coração e aí poderá queimar mais gordura.
7. Menos máquinas para as mulheres
Muitas das mulheres que realizam um programa de força ou tonificação preferem as máquinas ao peso livre, no entanto devia ser o contrário. Para os objetivos que normalmente as mulheres perseguem o peso livre é mais indicado que o trabalho nas máquinas clássicas da sala de musculação. Tradicionalmente criou-se a ideia de que o trabalho de força com pesos livres com barras e halteres é para objetivos de hipertrofia muscular para homens fortes e que as máquinas são melhores para os objetivos de tonificação das mulheres, mas na verdade não é bem assim.
As máquinas apareceram no mercado na década de 80 para conseguir um trabalho localizado e analítico dos diferentes grupos musculares para produzir mais hipertrofia com estímulos seletivos, uma vez que o trabalho com pesos livre produz adaptações de força mas ao implicar sempre uma cadeia muscular não se consegue um estímulo tão seletivo como nas máquinas. E assim as mulheres que se afastam do trabalho com peso livre pensando que não é para elas e acabam por treinar exclusivamente nas máquinas estão a fazer um treino bastante contrário aos seus objetivos. O trabalho em máquinas é mais cómodo e pode estar indicado para quem se está a iniciar, mas posteriormente há que ir progredindo para os pesos livres. Se o seu objetivo como mulher é melhorar os níveis de força sem hipertrofia, a tonificação geral, o controlo corporal com desenvolvimento da coordenação intermuscular, deve pensar em trabalhar com pesos. O ideal para mulheres é aplicar exercícios multiarticulares onde se impliquem grandes grupos musculares como agachamentos e lunges para o trem inferior e push-ups, remadas e elevações assistidas para o trem superior. O que é determinante para conseguir um tipo de adaptações não são os meios utilizados mas os métodos aplicados, pelo que pode continuar o seu trabalho de força-resistência mas muito melhor com os pesos livres.
8. Antes de treinar não comas nada
Por vezes chega a hora do treino e já estamos há várias horas sem comer, e mesmo antes do treino aparece aquela sensação de fome e o seu cérebro e estômago pedem comida, inclusivamente o nível de glicose pode estar baixo. A primeira resposta é comer alguma coisa para não ficarmos sem energia durante o treino, no entanto, comer ou beber alguma coisa, sobretudo com glucose, mesmo antes de treinar é um grande erro. É muito difícil que o seu corpo fique sem energia por não ingerir nada antes de treinar, para isso possui sistemas de aporte de energia que se ativam ao realizar exercício.
Quando nos começamos a mover ou realizar contrações musculares gerais, o organismo segrega a hormona cortisol através do pâncreas que por sua vez se encarrega de fornecer a glucose proveniente das reservas de glicogénio muscular e hepáticas ao sangue. Poucos minutos depois de começar a treinar poderá verificar como o seu organismo pode treinar perfeitamente e além disso a sensação de fome desaparece.
Conselho: É fácil cair na tentação de beber um café cheio de açúcar ou um chocolate antes de treinar, mas tente superar essa sensação que o seu cérebro envia. Bebe um pouco de água e comece a treinar com um aquecimento progressivo.
9. Suplementos misturados são melhores do que puros
Muitos suplementos são sobrevalorizados, mas muitas pessoas também sobrevalorizam os nutrientes isolados em relação aos que já vêm misturados com outros. Há suplementos que se comercializam isolados e de forma pura como o monohidrato de creatina, os aminoácidos ramificados ou a glutamina, muitas pessoas compram-nos desta forma e tomam-nos diretamente pensando que outros compostos são de qualidade inferior. O que não sabem é que o nosso organismo não é capaz de assimilar estes isolados e na maioria dos casos são expulsos sem serem absorvidos. A explicação é muito simples pois precisamos que a hormona insulina esteja presente para que o isolado possa penetrar na célula, pelo que necessitamos de outros componentes que estimulem a hormona insulina. Por essa razão muitos suplementos são comercializados em combinação para facilitar a absorção.
Conselho: Se tens algum isolado puro é melhor que os tome juntamente a uma refeição principal ou juntamente com um batido. Estes são pensados para complementarem e não para se tomar de forma isolada. Recomendo que estude as diferentes fórmulas já elaboradas que existem no mercado pois vêm com misturas eficazes que facilitam a sua absorção e metabolização e com sabores agradáveis.
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